segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Semifusa

Cinco horas da tarde, um cigarro entre os dedos e uma música dos anos 80 no rádio, meu pensamento tá longe, longe demais para saber voltar, eu li muito Caio F. hoje, queria saber se você gosta também, senti vontade de te apresentar todas essas coisas que eu gosto e fazem parte de mim, esqueci de perguntar se você gosta dele, mas eu estava tão entorpecida de suas palavras que nem lembrei de Caio, nem de Charles Bronson, nem de dizer que eu não como arroz e feijão, e sinceramente odeio filmes de terror, esqueci, devia ter dito, essas coisas fazem parte da composição do ser, quando me dei conta disso, fiquei intrigada, o que será que você não me disse? Um medo, um trauma, um vício, eu lembro que perguntei a você dos vícios, você falou da poesia, cerveja e nicotina, de vez em quando, eu não revelei que tenho essa mania feia de roer as unhas, nem que antes de dormir, falo sozinha, converso comigo e com meus amantes imaginários, imagine, coisa de mulher sozinha, você pensaria que sou louca, mas não sou, ou sou tão pouco que isso não interferiria em nós, veja só, já uso um nós, quando ainda somos você e eu. Tenho esse lado esperançoso que vibra sempre que algo bom acontece, nesse caso é alguém bom, novidade pipocando em minha retina, e nem perguntei pra que time você torce, não deve ser corinthiano, não pode ser, vai me chamar de bambi e essas coisas, nunca dá certo com corinthianos, ainda mais nesses tempos de pré-segunda divisão, eles ficam sensíveis, eu bem sei.

Devia ter contado que ando com medo, falei do fim do namoro velho, acabou tão triste, e confesso, ainda lembro dele, não com aquele amor, mas com uma tristeza, sempre é triste quando não dá certo, não contei detalhes, você também não perguntou, deve saber da dor do fim, a agonia, a preguiça, falei dessa preguiça de começar de novo, ainda que venha um desejo de tentar, dá uma preguiça, mas você sabe alimentar, mandou-me um poema, tão lindo, você é todo cercado de poesia e me carrega junto, então vamos voando e voando e há sete dias eu estou no ar.

Queria fotografar minha janela agora, está um céu lindo, um brilhinho de sol por trás das nuvens branquinhas, e olha, se eu contasse ninguém acreditaria, estão as nuvens entre os fios de alta tensão, por um segundo enxerguei uma partitura, as notinhas pintadas de preto, breves, semibreves, colcheias e semifusas! Muitas semifusas! Desejei meu violino antigo, esqueci, não sei mais tocar, se soubesse tocaria pra você, alguma canção de vento, ainda sei cantar, então ensaio qualquer coisa e faço um lararará pra você, esqueço que você não está aqui, e solto o ar assim, sem pressa, um suspiro de cansaço, e penso em dormir, mas já estou dormindo há tempos, pensando bem, está na hora de acordar e ir ali me pendurar nos fios de alta tensão, como os pássaros, pousando neles sem medo dos choques, vou pousar nos teus fios, mas por favor, não me eletrocute.